“FINCO O MEU REMO NA ÁGUA LEVO O TEU REMO NO MEU”
O dia vai vencer aos poucos o frio
acredito ter visto uma luz ao outro lado do rio.
Principalmente acredito que nem tudo está perdido
tanta lágrima, tanta lágrima
e eu sou um copo vazio.
ouço uma voz que me chama... quase um suspiro
rema, rema, rema.
Nesta margem do mundo
o que não é represa é baldio
acredito ter visto uma luz ao outro lado do rio.
Eu, muito sério, vou remando
e bem lá dentro, sorrio
acredito ter visto uma luz ao outro lado do rio.
. mais de quarenta anos sem interpretar o “rio” que atravessamos durante essa vida de boiada. a maioria continuou na mesma margem como um copo vazio. agora, tratamos de recompensar o tempo vão. caminhando, protestando, remando para chegar “a outra margem do rio”. já li que “nenhuma história restringe-se às suas margens: sempre existem os desvios, as infiltrações, as rachaduras, as potências a latejar pequenos tremores; o sujeito a desfazer-se no movimento”. é o que vai acontecer? a tevê não se cansa de mostrar os protestos, de todas as esquinas, conforme seus interesses. e a manada da minha aldeia não conseguiu nem transgredir. não desceu na contramão a avenida principal da cidade para protestar. não foram capazes de tripudiar na frente da casa do povo... “ei vereador leve junto o seu fedor”. da corrupção, da mutretagem. não. passaram batido, cada um com suas premissas, tolerâncias e raivas a lhe guiar. manada é o meu preconceito. “talvez o objetivo hoje em dia não seja descobrir o que somos, mas recusar o que somos”, escreveu foucault. não sou. sou? hanna arend dizia que o mundo não é humano por ser feito de seres humanos ou por que tem uma voz humana, mas sim porque partilha, ou seja, se solidariza, com o mundo e com os homens, e discute a humanidade da vida. hanna, sou mais rasa que o raso rio. seria capaz de levar pedras nos bolsos e jogar contra algumas instituições durante o trajeto das ilusões. esse momento histórico que vive o país não me emociona. mais preconceituosa fiquei. ou crítica? se o primeiro, me vejo uma ignorante. se crítica, preciso rever meus conhecimentos práticos de mundo nesse percurso tendencioso por onde passam as águas da vida. tempo de comunicação em tempo real: cada cartaz levantado, cada bandeira brasileira feito manta nas costas dos manifestantes vai direto para o facebook, para a globonews. nossos atos universalizados instantaneamente nos ligando, linkando, conectando a todo cafundó do planeta. até dá pra imaginar a extensão que alcança uma idéia preconceituosa ou um ônibus incendiado em protesto tomando o rumo do infinito, pela internet. e do rio, sampa, brasília até chegar na minha aldeia, imitamos e gritamos as mesmas frases. vamos todos pra lá, pra cá, ê boiada. nesta margem do mundo, o que não é represa é baldio.
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