setembro 15, 2013

DO MEU BLOQUINHO

1943 Arquivo Helena Ahlert

Mês passado caiu nas mãos um livro escrito por um delegado nos anos 50 ou 60. Tema: escolas e clubes  sociais de origem alemã no Brasil que seriam usados pela política de expansão intercontinental de Hitler para divulgar a doutrina ariana. O delegado citou Lajeado, Estrela, Santa Cruz -  mas, principalmente, Porto Alegre. Não duvido de nada. Duvido de tudo. É sabido: quem narra a história acaba se cobrindo com a manta tendenciosa dos seus próprios interesses. 

Durante os anos da ditadura, em pleno vigor de 1973, concluí o ginásio em um colégio evangélico. Fiz parte da turma B da quarta série. Enquanto a turma A dizia que éramos da turma dos Burros, revidávamos que eles eram da turma dos Atrasados. Um bullying que acabava em risada porque tínhamos amigos queridos nos Atrasados. Na verdade, quem pensaria em bullying naquela época quando o maior bullying sofrido vinha da parte de alguns professores?
Um ano antes, certa noite de 1972 -  orra, século passado! -  alunos do Científico entraram na diretoria e roubaram os exames de final de ano. Em seguida  fizeram cópias das provas e distribuíram na maior generosidade. E assim todos aqueles que estavam por um fio trataram de estudar corretamente...
Solidários, os meninos também surrupiaram as provas da 3ª série.
Nunca  descobrimos os audaciosos. 
Logo os crânios da turma resolveram as questões e nós tratamos de decorar as respostas. Como nunca confiei na minha memória e como Matemática, Física, Química não eram as matérias preferidas, colei tudinho na minha própria classe -  de madeira. E para não levantar suspeitas, calculei acertos que rendessem uma nota 7. Ja me bastava.
Mas não adiantou.
Uma comissão germânica entrou na sala.  Disciplinarmente, levantamos todos das cadeiras. “Podem sentar.” – disse o diretor. Em seguida expôs o que havia acontecido na escola. Na verdade uma enxurrada de notas boas.
Então o diretor perguntou: “Levante o braço quem teve acesso à prova de final de ano.”
Na maior cara dura, não ergui. Aliás, só Lia e eu não erguemos a mão.
Resultado: passei a manhã presa em uma sala. Sozinha.
Antes da libertação, uma junta de quatro professores, sentados a minha frente, exigiam a verdade com um interrogatório surreal.  E ainda queriam que eu delatasse os “ladrões”. Diga-se - ladrões que pertenciam as digníssimas famílias da sociedade lajeadense, futuros empresários, bancários... Mas, na época eu não sabia e mesmo sabendo guardava na consciência a  voz de meu pai: o pior tipo de gente são os dedos-duros.
Hoje sei que as atitudes da diretoria se justificavam pelo momento político vivido no país. Seguiam a cartilha da opressão.
E quanto a Lia? 
Acho que não foi chamada porque realmente não recebera cópia das provas.  Lia vinha do interior e quase não abria a boca na sala de aula. Era inocente. Talvez, de todo não fosse porque sabia que a turma tinha as provas. Se acusou alguém, nunca soube.
No ano seguinte, roubaram as provas outra vez. Buchincho grande na escola e na comunidade.
A gurizada do Científico era mesmo medonha...


Em outubro parece que vão reunir os ex-alunos em uma festa que inclui os 40 anos de formatura da 4ª serie do curso ginasial. Mandaram a relação da Turma B. Mas não vi o nome da Lia... 
Anelise Lucena Von Fruhauf
Arno Henrique Rockenbach
Clécio Hofstatter
Denise Lore Renner
Ditmar Henrique Born
Gladis Beatriz Ritter
Gunter Erdman Gauer
Humberto Roos
Ingrid Bernardina Schwingel
Jair Paulo Labres
Julio Tarter Neto
Karin Cristina Bencke
Ladí Egger
Laura Merten Peixoto
Mara Beatriz Neumann
Márcia Beatriz Hexsel
Margareth Irene Schaffer
Maria do Carmo Gomes
Marlene Troller
Marlise Marazini
Nairo Rogério Tischer
Norberto Ferri
Rosangela Ritter
Sereno Griesang
Silvia Regina B. Pontes
Suzana Ingeburg K. Von Fruhauf
Suzana Trentini
Vitor Mário Ritter
Walmor Rohsig

Uns já partiram. Uns se perderam. Uns não se reconhecem mais. Uns nunca mudaram. 


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